terça-feira, outubro 05, 2010

"Vale Tudo", 22 anos depois.


Acabo de assistir ao primeiro capítulo de Vale Tudo, a clássica novela de Gilberto Braga, em reprise no canal Viva. Vejo novelas desde criança, quando via com minha mãe à noite, e rever essa, em particular, foi emocionante. Primeiro, porque a cada cena fui recordando personagens, nomes, referências... E ver os anos 80 com olhos de adulto... É como voltar para casa. Reconhecia os modelos de carros, os estilos de roupa e penteados, quase tudo. Rapidamente notei que a transição entre as cenas é muito mais brusca que hoje em dia, o ritmo narrativo é um pouco diferente, mas o texto de Braga tem uma imensidão de nuances que eu não entendia aos 9 anos de idade. O debate ético nos conflitos entre a protagonista Raquel (Regina Duarte) e sua filha Maria de Fátima (Glória Pires), as constantes referências à crise econômica da época (lembro bem dos constantes aumentos das mensalidades escolares, citada em uma cena, para citar um exemplo entre muitos), o desabafo do personagem de Sebastião Vasconcelos a respeito da corrupção e do sistema penitenciário, o desespero do executivo Ivan (Antonio Fagundes) ao se ver desempregado no primeiro dia de trabalho em função de uma compra não anunciada por sua nova empresa... Ainda deve levar um tempo para ver a famigerada Odete Roitman, a vilã de todas as vilãs, personagem que se tornou proverbial no Brasil. Aliás, ninguém faz uma ricaça esnobe como Beatriz Segall -- ou é assim, ao menos, que me lembro dela. De qualquer forma, mesmo sem ela, a novela tem um cenário muito rico, possibilitando uma verdadeira arqueologia televisiva -- e também autobiográfica, no meu caso.

A novela originalmente teve mais de 200 capítulos e o horário atual (0h45) não ajuda nada, mas vou tentar acompanhar. O Brasil ali mostrado é medonho, quase desesperador, mas tem algo de fascinante revivê-lo depois de tanto tempo. Numa cena, por exemplo, Maria de Fátima, após vender secretamente a casa onde vivia com a mãe em Foz do Iguaçu e fugir com o dinheiro para o Rio, discute com o gerente sobre aplicá-lo no velho overnight. A malícia inescrupulosa da personagem combina bem com as aplicações financeiras de um Brasil assombrado pela inflação da Era Sarney.

Fica a dica para os saudosistas e curiosos.

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