Essas são algumas das questões fundamentais daquele que provavelmente é o anime mais inteligente e elaborado a que já assisti, Hellgirl (Jigoku Shoujo). Diferentemente de um anime tradicional, não se trata aqui de um herói em sua jornada épica de crescimento em poder e habilidade até um desafio supremo, em temporadas intermináveis de episódios encadeados. Em Hellgirl, os protagonistas mudam a cada episódio e quase não guardam relação -- e não são heróis, mas sim pessoas comuns que se vêem às voltas com situações terríveis, diante das quais aparece a solução tentadora de uma vingança absoluta e imediata: mandar seu algoz/inimigo para o inferno. O problema é o preço dessa vingança. "Quando uma pessoa é amaldiçoada, dois túmulos são cavados", diz a espectral Donzela do Inferno, a Hellgirl do título, que oferece àqueles que recorrem ao seu website movidos pelo ódio um trato tão infernal quanto honesto: o envio imediato do desafeto ao inferno, após tormentos horríveis, com a condição de que o cliente também irá, mas só após sua morte. O que torna o anime tão interessante é que não se trata aqui de um mundo baseado na idéia cristã de justiça: a pessoa visada ou o contratante irão mesmo para o inferno, independentemente de serem pessoas virtuosas ou não. Em Hellgirl, a vingança é um absoluto espiritual que só pode ser combatido pelo perdão entre os adversários -- um bálsamo que raramente se manifesta.
Não é um desenho para crianças, logo se vê. É antes uma meditação sobre a perversidade e o ódio num nível que raramente se vê mesmo na literatura, que dirá num desenho animado. Em sua maioria, os "vilões" são pessoas também comuns, que podem ser bastante cruéis em situações específicas... ou simplesmente incompreendidas por sua suposta vítima. O que dá o mote da série não é a justiça, mas o rancor que tantas vezes se disfarça de indignação virtuosa e exige um tipo de retribuição que pode ser simplesmente desproporcional. Quem quer que tenha um mínimo de sensibilidade filosófica, vai ter muito o que pensar após cada episódio. Como bônus, existem também outros elementos que tornam o desenho uma experiência instigante: a trilha sonora ora melancólica e delicada, ora assustadora, bem adequada aos grandes temas da história; a beleza dos traços utilizados, mais realista dentre os estilos de anime; e, finalmente, as várias referências ao impressionante folclore japonês, rico de criaturas e conceitos tão diferentes daqueles a que estamos acostumados.
Não é um desenho para crianças, logo se vê. É antes uma meditação sobre a perversidade e o ódio num nível que raramente se vê mesmo na literatura, que dirá num desenho animado. Em sua maioria, os "vilões" são pessoas também comuns, que podem ser bastante cruéis em situações específicas... ou simplesmente incompreendidas por sua suposta vítima. O que dá o mote da série não é a justiça, mas o rancor que tantas vezes se disfarça de indignação virtuosa e exige um tipo de retribuição que pode ser simplesmente desproporcional. Quem quer que tenha um mínimo de sensibilidade filosófica, vai ter muito o que pensar após cada episódio. Como bônus, existem também outros elementos que tornam o desenho uma experiência instigante: a trilha sonora ora melancólica e delicada, ora assustadora, bem adequada aos grandes temas da história; a beleza dos traços utilizados, mais realista dentre os estilos de anime; e, finalmente, as várias referências ao impressionante folclore japonês, rico de criaturas e conceitos tão diferentes daqueles a que estamos acostumados.
Enfim, se você guarda rancor contra alguém, ver Hellgirl pode ser uma forma de repensar sua situação. Mais que sermões e preces, às vezes a melhor forma de se livrar do ódio é ver o que ele capaz de provocar. E nesse ponto, ninguém é mais versado que essa menina espectral de olhos vermelhos e tristes...
2 comentários:
Encantada com o tema e com tuas palavras...
Vou procurar, com certeza. Japonês tem tanto requinte em sua crueldade! Já leu Grotesque, da Natsuo Kirino?
http://www.ew.com/ew/article/0,,20014240,00.html
Ótimo!
Bjs,
Cla
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