domingo, outubro 15, 2006

O "empurrão" que faltava

Vencedor do Nobel da Paz ajuda necessitados de Bangladesh

NOVA DÉLHI (Reuters) - Para um homem que talvez tenha feito mais do
que qualquer outro para ajudar a tirar as pessoas da miséria,
Muhammad Yunus não se desculpa por não dar esmolas a mendigos.

Yunus é o fundador do Grameen Bank, que concedeu mais de 5,7 bilhões
de dólares em microcrédito para bengaleses pobres, fornecendo uma
bóia de salva-vidas para milhões de pessoas e um modelo de banco que
foi copiado em mais de 100 países, dos Estados Unidos a Uganda.

Mas a filosofia de Yunus é a de ajudar os pobres a se ajudarem: dê a
um homem um peixe e você o ajuda por um dia, mas ensine-o a pescar e
você o ajuda a vida toda. Por isso, ele nunca responde quando um
mendigo cego ou aleijado, ou quando uma mãe com um bebê nos braços,
estendem a mão em busca de um trocado.

"Eu me sinto mal, às vezes, eu me sinto horrível, por negar algo a
essa pessoa. Mas eu me contenho. Nunca dou nada a eles", disse Yunus
à Reuters em uma entrevista feita em 2004 em seu escritório na
diretoria do Grameen. "Eu preferiria resolver o problema do que
apenas lhes dar uma ajuda e cuidar deles por um dia."

Esse professor de Economia, que junto com seu banco ganhou o Nobel da
Paz deste ano, vem tentando solucionar o problema desde 1976, quando
emprestou o equivalente a 27 dólares para 42 mulheres em uma vila
perto de sua casa, na cidade portuária de Chittagong.

As mulheres deviam a agiotas que lhes cobravam taxas extorsivas, e o
objetivo inicial de Yunus foi o de convencer um gerente do banco
local a dar a essas mulheres um crédito regular. Mas o banco disse
que isso era impossível sem uma garantia.

Yunus então decidiu mostrar que eles estavam errados. O Grameen --o
nome significa vila em bengalês-- hoje desembolsa dezenas de milhões
de dólares por mês para 6,6 milhões de pessoas, das quais 96 por
cento são mulheres.

"Estou muito feliz por ter continuado e porque isso cresceu e virou
uma instituição e realmente provou seu valor", afirmou
Yunus. "Fizemos algo que colocou uma interrogação em todo o sistema
bancário. Os bancos nunca mais serão os mesmos."

FOME MUDOU SUA VIDA

Nascido em 1940 em Chittagong, o centro comercial do que era então o
leste de Bengala, ele é filho de um ourives que teve 14 filhos --
sendo que cinco morreram ao nascer.

Uma fome devastadora que atingiu Bangladesh em 1974, deixando
centenas de milhares de mortos, mudou sua vida para sempre. Uma
viagem à universidade naquele ano o fez questionar se as teorias
econômicas modernas poderiam realmente dar justiça social aos pobres.

"Enquanto as pessoas morriam de fome nas ruas, eu ensinava teorias
elegantes de economia", disse ele a Alan Jolis, co-autor de um livro
sobre a sua vida, "The Good Banker", em um artigo publicado em 1996
no jornal britânico Independent on Sunday.

"Comecei a me odiar, (a odiar) a arrogância de fingir que tinha
respostas", acrescentou. "Nós, professores universitários, somos tão
inteligentes, mas não sabemos absolutamente nada sobre a pobreza que
nos cerca. Eu decidi então que os próprios pobres seriam meus
professores."

NÃO CHORE PELOS POBRES

Yunus tem orgulho de que o microcrédito tenha se espalhado pelo
mundo. Se os pobres tiverem o mesmo acesso ao crédito que os ricos,
eles vão prosperar, diz.

"Deixe com as pessoas", afirmou à Reuters. "Elas podem tomar conta
delas mesmas. Você não precisa derramar lágrimas por elas. Elas são
muito capazes."

O Banco Grameen recupera quase 99 por cento de seus empréstimos e os
seus clientes não precisam de garantias. Todas as transações são
feitas em reuniões públicas semanais em um país em que a corrupção é
endêmica. O Grameen dá empréstimos livre de juros para os muito
pobres.

"Por que os pobres não deveriam ter acesso aos serviços financeiros?
Por que a tecnologia da informação deve ser privilégio exclusivo dos
ricos? Por que não projetar coisas para os pobres?", pergunta Yunus.

Yunus desafia os críticos, que dizem que seu banco dá empréstimos
muito pequenos, e insiste que não está lançando uma guerra contra os
ricos, mas que apenas está ajudando os pobres.

"Não me importo se os ricos ficarem mais ricos. Isso não me incomoda.
O que me preocupa é os pobres ficando mais pobres e não
enriquecendo", diz.

"Se houver vários Bill Gates no país, não me importo. Levantar a base
da sociedade é o mais importante."

(Escrito por Alan Wheatley e Simon Denyer)

Nenhum comentário: