quarta-feira, maio 13, 2009

Governo cria site com documentos e dados sobre a ditadura

Lula diz que abertura de arquivos da ditadura não é questão de revanchismo

Publicada em O GLOBO online, 13/05/2009 às 15h43m

Chico de Gois e Bernardo Mello Franco; Agência Brasil

 BRASÍLIA - Ao discursar na cerimônia de anúncio de iniciativas do governo federal para facilitar o acesso a informações públicas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a ação não deve ser vista como revanchismo por parte dos militares, que frequentemente se opõem à abertura de arquivos do tempo da ditadura (1964-85). Lula observou que a democracia ganhará quando se conseguir "desvendar alguns mistérios" que continuam sem solução, numa referência indireta ao paradeiro de 140 desaparecidos políticos durante o regime militar.

Vamos prestar um serviço à democracia brasileira na hora que a gente conseguir desvendar alguns mistérios que ainda persistem na nossa história

- Estou convencido que nós vamos prestar um serviço à democracia brasileira na hora que a gente conseguir desvendar alguns mistérios que ainda persistem na nossa história - afirmou o presidente, durante o lançamento do site "Memórias Reveladas" , que colocará à disposição da população, na internet, documentos sobre a ditadura militar. ( Áudio: Lula diz que lançar o site foi uma mudança de página na história do Brasil )

Lula também declarou que o acesso à informação é essencial e que, quando deixar o governo, em 2010, se tiver feito algo de errado, a informação deve se tornar pública. A nova lei, encaminhada ao Congresso Nacional, tem um princípio básico: informações sobre direitos humanos não poderão nunca ser ocultadas.

- E que ninguém veja isso como se fosse revanchismo porque daqui a um ano e meio deixarei o governo, e tudo o que eu fizer de errado, quem vier depois de mim, tem mais é que dizer as coisas que eu fiz de errado e que eu não posso achar que a pessoa está me perseguindo - disse.

A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), e o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), ambos perseguidos na época da ditadura e pré-candidatos à sucessão presidencial no ano que vem, participaram da solenidade.

( Leia mais: Ao lado de Dilma e Serra, Vanucchi diz que alternância de poder é saudável )

Para Lula, o direito à informação pública é um dos mais eficazes instrumentos de combate ao arbítrio e à corrupção.

- O anteprojeto contém dispositivos que possam garantir que as instituições do Estado não possam ocultar violações de direitos humanos cometidas pelos seus agentes ou a mando dos mesmos - informou.

Dilma: Criação de portal acaba com 'cultura de segredo de Estado'

Para Dilma, a criação de um portal para colocar à disposição da população, na internet, documentos sobre a ditadura militar acaba com a "cultura do segredo de Estado".

- Ela (a cultura do segredo de Estado) está sendo superada pelos esforços do governo e da sociedade - disse a ministra.

O portal Memórias Reveladas vai tornar disponíveis informações do período de 1º de abril de 1964 a 15 de março de 1985. Os documentos foram recolhidos dos extintos Serviço Nacional de Informações (SNI), Conselho de Segurança Nacional (CSN) e Departamento de Ordem Política e Social (Dops).

Também foi assinado nesta quarta, durante evento no Palácio Itamaraty, uma portaria para que os arquivos sobre a ditadura militar em mãos de particulares sejam entregues ao governo.

 

5 comentários:

Alexander Gieg disse...

Expor às claras o que figuras públicas fazem e fizeram é sempre bom. O único problema é que essa abertura em particular é unilateral. Falta mostrar os documentos comprometedores que o "outro lado" esconde.

Rodrigo disse...

Não é minha área de especialização, mas... que "outro lado"? A esquerda armada, fragmentada e perseguida? Organizações clandestinas e pouco estruturadas não costumam ter grande documentação, muito menos uma "oficial". No mais, até onde sei, o conhecimento sobre o "outro lado" é até bastante extenso.

Alexander Gieg disse...

Algumas delas podem de fato ter tido pouca documentação, ou mesmo nenhuma. Mas outras eram patrocinadas e treinadas por Havana ou mesmo diretamente por Moscou. Os detalhes do que de mais significativo planejaram, com quem planejaram, com quais objetivos, e por aí vai, está documentado nos arquivos secretos desses países. Só temos como deles saber o que voluntariamente divulgam, e o que divulgam é apenas aquilo que julgam auto-enaltecedor. O restante permanece oculto.

Rodrigo disse...

Dos que foram a Cuba para serem treinados, sabe-se algo, sim. Foi o caso do... Lamarca ou Marighella (eu sempre os confundo). Quanto aos laços diretos com Moscou, parece-me já bem estabelecido no caso dos anos 1930, o que é de conhecimento geral. Dos 1960-70, não sei. Ainda assim, esses arquivos secretos não são mais tão secretos, haja vista a literatura que surgiu no pós-1991. Duvido que haja algo muito inovador para se ver aí, mas, se houver, seria o caso de pedir a esses países a liberação. No mais, sem desdenhar esse lado da história, o que está ao alcance do governo brasileiro, que são seus próprios papéis, ao que parece está sendo liberado, o que é muito bom.

E não custa lembrar que, no que concerne a esse período, a ação do Estado pesou muito mais e sobre mais gente que as ações de grupelhos de extrema-esquerda. Embora a importâncias destes seja muito enfatizada pelos defensores do regime militar, quando não exagerada, não há comparação possível na escala das ações.

Alexander Gieg disse...

A comparação é possível quando se olha o número de vítimas. Em termos absolutos, o governo militar matou entre 300 e 400 pessoas, e os guerrilheiros cerca de 200. Evidente aí que, em termos relativos, o número de "vítimas per capita" dos guerrilheiros é bem pior do que o do regime. Já quando o assunto é tortura e assemelhados, o governo militar certamente aparece em posição bem pior. Por outro lado, os guerrilheiros eram apoiados e apoiavam (ainda apóiam), com conhecimento de causa, ditaduras com um perfil muito mais violento e totalitário do que o foi a brasileira.

No frigir dos ovos eu diria que nenhum dos dois lados saiu da coisa em posse do "moral high ground".

No mais, nenhuma discordância. :)