quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Depois

Dois anos... Não, não dois, mas três. Três anos. E agora que a tenho diante de mim, a sensação é de anticlímax. Talvez como o amante que, finda a euforia do primeiro momento, se vê ao lado de uma estranha que nada mais lhe diz. Uma indiferença esquisita, que ainda tem vestígios da forte emoção que a precedeu — como um cansaço. Sim, é essa a palavra: cansaço. Corpo e mente parecem dizer, “Chega!”, mesmo sabendo que isso ainda não é possível. Sinto-os esfriando, esvaziando-se de uma obsessão de semanas, até meses, querendo se convencer de que tudo acabou, que chegamos ao fim. Mas uma razão inabalável insiste que ainda não é a hora, não estamos no fim. Verdade que chegamos perto, que cruzamos um ponto sem retorno... Mas ainda há mais pela frente.

Olho-a, entre exausto e enternecido, quase surpreso por ela e por mim. Não é propriamente que ela tenha perdido o encanto, mas neste momento tudo que a sua lembrança me desperta é o vazio. Vejo-me querendo fugir para longe, para outras memórias, outros momentos. Não que isso realmente fosse me deixar mais feliz... Certas coisas, longe ou perto, continuam conosco, presas não se sabe por que grilhão. Parecem se entranhar em nossa alma por mais que tentemos nos afastar delas. Mas, mesmo que pudesse, eu não seria capaz de fugir. Simplesmente não encontro forças.

Por três anos ela obcecou meu pensamento. Em meus parcos planos de futuro, lá estava ela como uma sombra, primeiro como ambição e depois como uma sentença. E eis que agora ela me contempla, impassível, serena, como se nem tomasse conhecimento das incontáveis horas de frenesi que despertou. Como um ídolo acostumado à adoração, eis que parece esperar, ciumenta, que eu a busque e retome sem delongas, com a dedicação absoluta dos maníacos e a energia dos quase desesperados.

Dei-lhe o melhor de mim. E mesmo quando já não tinha o melhor, sacrifiquei-lhe de bom grado o que mais havia. Verdade que toda nossa longa convivência foi mais feita de arroubos, explosões, que da dedicação constante e diária mostrada por tantos outros. Não fui o mais fiel dos seguidores, nem o mais presente dos companheiros; mas, em minha inconstância, entreguei-me da forma que podia. Não é o que deveria importar? A perfeita entrega de um amor imperfeito, como deveriam ser todos os amores.

Mas estamos quase no fim de nossa longa dança... Eu exausto, é fato, mas ainda ciente de que a música não acabou. É preciso ir adiante, mesmo que cada próximo passo pareça carregado de angústia. Em frente, sempre em frente.

Olho para ela, e vejo parte de mim. Labores, aflições, questionamentos e inspiração distribuídos ao longo de duzentas e sessenta e cinco páginas. Minhas, todas elas. Cruas e carentes de refinamentos, eu sei, por mais que soe tentador dá-las por terminadas. E elas me fazem lembrar o quanto eu gostaria de saber que tudo já passou, que posso olhar para trás com a sóbria satisfação do dever cumprido.

Contudo, não posso. Não ainda.

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