Escritora Heloísa Seixas compilou os melhores contos do autor inglês Blackwood, um mestre do horror que é pouco divulgado até em seu país
por SCHNEIDER CARPEGGIANI
Aos 82 anos, o inglês Algernon Blackwood foi convidado para ler na TV uma história assombrada na noite de Halloween. Usando duas câmeras e dois cenários iguais, o diretor do programa conseguiu um feito extraordinário para aquele ano de 1947: fez Blackwood desaparecer, deixando para os telespectadores apenas sua voz em off e sua cadeira vazia ocupando a telinha. No dia seguinte, a repercussão na Inglaterra foi retumbante. E acabou marcando também um dos últimos momentos de glória da carreira desse que foi considerado um dos maiores autores de terror do começo do século 20, hoje em dia, praticamente esquecido. Até mesmo em sua terra natal, seus títulos são difíceis de ser encontrados.
Pelo menos para os brasileiros, Blackwood acaba de receber os créditos merecidos. A escritora Heloísa Seixas compilou e traduziu alguns dos seus principais contos, na coletânea A Casa do Passado. "Eu, que me interesso muito por literatura de terror, jamais ouvira falar dele, até o dia em que comprei num sebo uma antologia de contos assombrados, da editora Modern Library", disse Heloísa, por telefone.
Os fãs de literatura de terror devem lembrar que essa não é a primeira contribuição de Heloísa ao gênero. Ela já organizou Depois - Sete Histórias de Horror e Terror, com textos de autores diversos, como Edgar Allan Poe e o próprio Blackwood; e Visões da Noite, centrado na obra de Ambroce Bierce, escritor que gostava de misturar lendas estranhas com psicopatas em seus escritos. Do seu próprio legado, Heloísa lançou ainda Pente de Vênus, excelente reunião de contos, que comunga os arrepios próprios de uma estória de terror, com outros segmentos, como o mistério e o erotismo.
No texto de apresentação que preparou para A Casa do Passado, Heloísa descreveu de forma magistral o que Blackwood faz com o leitor: "Comecei a ler uma das suas histórias, chamada Os Salgueiros. De repente, como ocorre com os personagens das histórias de fantasmas, lá estava eu, cenho franzido, lábios apertados, mãos úmidas segurando as bordas do livro, uma sensação de arrepio, uma inquietação. Eu estava com medo."
O melhor na literatura de Blackwood é que ela se distancia do clichê de sangue, fantasmas e vampiros. Nela, o medo surge aliado ao drama interno da personagem: ou seja, ele pode existir ou não. Seu texto é permeado por aquela sensação de se estar sozinho em casa e escutar algum barulho, como o som de janelas batendo. Sempre pode ser o vento ou não, tudo depende do seu estado de nervos.
O conto Os Salgueiros, que Heloísa afirmou ter sido o primeiro de Blackwood que teve contato, exemplifica bem o estilo do autor. Dois viajantes acampam em uma ilhota, até então, aparentemente virgem de presença humana. Por todos os lados, uma gigantesca extensão de salgueiros. De uma hora para outra, ambos começam a ter visões e a sentir que seus mantimentos estão sumindo. Está criado um cenário claustrofóbico que Blackwood descreve com calma e muita sutileza.
Outro ponto bem interessante no seu texto são pequenas pinceladas de ficção-científica, gênero ainda bem incipiente naquele começo do século 20.
SEM DENTADAS - Com as suas antologias, Heloísa Seixas está ajudando a divulgar a literatura de terror no Brasil, um gênero que nunca encontrou grande abertura em território nacional. "Não sei citar um grande autor ou obra de terror brasileira. Pode até existir, mas não tenho conhecimento", disse Heloísa.
Fã do gênero desde pequena, a autora afirmou que não tem muito interesse em histórias com monstrengos, como vampiros ou lobisomens. "Prefiro uma abordagem mais psicológica nesse caso, na qual o terror passe pelas emoções da personagens e também por algo que não consegue ser explicado."
Heloísa listou ainda as estórias que mais a arrepiaram na vida: Ruínas Circulares, de Borges; Os Salgueiros, de Blackwood; A Queda da Casa de Usher, de Edgar Allan Poe; e O Túmulo, de Lovecraft.
Um comentário:
Será lido em breve. Nada como receber uma boa dica de terror.
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