domingo, janeiro 23, 2005

Para ler em noites de tempestade...



Um dos grandes mestres do terror sobrenatural do século XX, o americano Howard Phillip Lovecraft (1890-1937) criou toda uma cosmogonia aterradora de deuses arcanos e avançadíssimas civilizações pré-humanas. O seu O Chamado de Ctulhu é um dos maiores clássicos da ficção sobrenatural já escritos e ajudou a dar forma a todo um subgênero dentro do campo. Misturando o que viria a ser chamado de “ficção científica” com línguas estranhas, referências histórico-arqueológicas, velhos mitos orientais e uns toques de magia, Lovecraft criou um universo todo próprio, longe do tipo mais comum de horror – aquele que envolve monstros consagrados, geralmente folclóricos, como vampiros, espectros e lobisomens. Em nossa época saturada de imagens, que tirou muito do que esses seres lendários tinham de assustador, o imaginário lovecraftiano continua muito eficiente, praticamente intacto. O motivo? Como o próprio Lovecraft dizia, nenhum medo é tão grande quanto o medo do desconhecido. E disso suas histórias estão cheias...

O universo lovecraftiano deu muitas crias, sendo o grande inspirador de vários filmes B (Reanimator é um dos mais conhecidos -- ou menos ignorados -- aqui no Brasil), histórias em quadrinhos (como a velha revista Kripta) e toda uma linha de RPGs de terror. Recentemente, a Editora Iluminuras começou a lançar traduções das principais obras do velho H.P. e a LPM publicou um seu romance O Caso de Charles Dexter Ward, que tem como tema o típico intelectual recluso aficionado por antiguidades que acaba envolvido numa perturbadora trama de necromancia e segredos de família. Se você acha que Stephen King é o “mestre do terror”, provavelmente andou dando muito crédito à propaganda de editoras e estúdios hollywoodianos. Lovecraft tem um estilo único, e não por acaso é venerado pelos fãs da literatura “escura”.

Foi com grande prazer, portanto, que descobri um repositório de textos em português do pai do mito de Ctulhu. Os arquivos estão em formato PDF e têm todos menos de 500Kb. De quebra, o mesmo site ainda possui uma tradução de Os Salgueiros (The Willows), de Algernon Blackwood, também considerado um mestre da literatura fantástica e ídolo do próprio Lovecraft (admiração que infelizmente não era mútua...). O endereço é: http://www.sitelovecraft.cjb.net.

sexta-feira, janeiro 14, 2005

Diálogo entre o Amor e a Indiferença

Chiaroscuro Rose
He:

Fill your bowl with roses: the bowl, too, have of crystal.
Sit at the western window. Take the sun
Between your hands like a ball of flaming crystal,
Poise it to let it fall, but hold it still,
And meditate on the beauty of your existence;
The beauty of this, that you exist at all.

She:

The sun goes down, -- but without lamentation.
I close my eyes, and the stream of my sensation
In this, at least, grows clear to me:
Beauty is a word that has no meaning.
Beauty is naught to me.
He:

The last blurred raindrops fall from the half-clear sky,
Eddying lightly, rose-tinged, in the windless wake of the sun.
The swallow ascending against cold waves of cloud
Seems winging upward over huge bleak stairs of stone.
The raindrop finds its way to the heart of the leaf-bud.
But no word finds its way to the heart of you.

She:

This also is clear in the stream of my sensation:
That I am content, for the moment, Let me be.
How light the new grass looks with the rain-dust on it!
But heart is a word that has no meaning,
Heart means nothing to me.

He:

To the end of the world I pass and back again
In flights of the mind; yet always find you here,
Remote, pale, unattached . . . O Circe-too-clear-eyed,
Watching amused your fawning tiger-thoughts,
Your wolves, your grotesque apes -- relent, relent!
Be less wary for once: it is the evening.

She:

But if I close my eyes what howlings greet me!
Do not persuade. Be tranquil. Here is flesh
With all its demons. Take it, sate yourself.
But leave my thoughts to me.
Conrad Potter Aiken, 1921

quinta-feira, janeiro 13, 2005

A solitude tem seus prazeres...

Feast
I drank at every vine.
The last was like the first.
I came upon no wine
So wonderful as thirst.

I gnawed at every root.
I ate of every plant.
I came upon no fruit
So wonderful as want.

Feed the grape and bean
To the vintner and monger:
I will lie down lean
With my thirst and my hunger.
Edna St. Vincent Millay

Beggarly Heart

 
 
When the heart is hard and parched up,
come upon me with a shower of mercy.

When grace is lost from life,
come with a burst of song.

When tumultuous work raises its din on all sides shutting me out from
beyond, come to me, my lord of silence, with thy peace and rest.

When my beggarly heart sits crouched, shut up in a corner,
break open the door, my king, and come with the ceremony of a king.

When desire blinds the mind with delusion and dust, O thou holy one,
thou wakeful, come with thy light and thy thunder


Rabindranath Tagore
 
 
 

sexta-feira, janeiro 07, 2005

Ars Poetica

Um poema deve ser palpável, silencioso,
como um fruto redondo

Mudo
como os velhos medalhões ao toque dos dedos.

Silente
como o gasto peitoril de uma janela em que cresceu o musgo

Um poema deve ser calado
como o vôo dos pássaros.

Como a lua que sobe,
um poema deve ser imóvel
no tempo,

deixando, memória por memória, o pensamento,
como a lua detrás das folhas de inverno;

deixando-o como, ramo a ramo, a lua solta
as Árvores emaranhadas na noite.

Um poema deve ser imóvel no tempo como a lua que sobe.

Um poema deve ser igual a:
não a verdade.

Para toda a história da dor,
uma porta franqueada e uma folha de ácer.

Para o amor,
as gramíneas inclinadas e duas luzes sobre o mar.

Um amor deve ser,
e não significar.


Archibald MacLeish (1892-1982)


quinta-feira, janeiro 06, 2005

Redefinições Semânticas Colhidas Semi-Aleatoriamente no Cotidiano

Femininas:

Ah, não sei [quando iremos sair de novo], estou toda enrolada = Não quero mais ver você.

Deixa que eu ligo para você = Não quero mais ver você.

A gente se fala = Não nos veremos tão cedo.


De seus futuros professores no mestrado:

Vou verificar essa informação para você e entro em contato amanhã mesmo = Eu vou esquecer completamente de verificar e de entrar em contato.

Mande-me seu projeto para revisar antes de inscrevê-lo no concurso = Assim que você me mandar o projeto, eu vou sumir da face da Terra até que seja tarde demais.

Você foi ousado na entrevista = Você disse uma grande bobagem na entrevista.


De um burocrata universitário:

O seu processo é coisa rápida, é de um mês para outro = O seu processo levará pelo menos três meses, com sorte.

O diploma fica pronto em 6 a 12 meses = O diploma fica pronto em pelo menos 18 meses.


De uma simpática moça à porta de uma igreja:


Você é cristão? = Você é protestante?

Religião não salva ninguém = Só minha religião salva.


De uma colega de trabalho:

Olha, eu vou precisar da sua ajuda numa coisinha = Olha, eu vou interromper seu trabalho com algo que poderia perfeitamente fazer sozinha se estivesse a fim.


De sua chefe de renome internacional:

Estou muito feliz que você tenha passado no mestrado e compreendo sua opção pela bolsa e a dedicação integral ao curso = Como você vai deixar seu trabalho aqui? Como pode fazer isso comigo? Eu arranjei esse posto para você [em agosto de 2003] e em outubro [de 2004] você já estava transando esse mestrado! Você tinha que ter me avisado [com ano e meio de antecedência] desses projetos! Como você põe seus interesses profissionais à frente dos meus!?




domingo, janeiro 02, 2005

Pílula Filosófico-Musical

"Amar é também agir."

Saint-John Perse



Música para acompanhar: La Dernière Lettre, de Paul Dwayne.