terça-feira, julho 26, 2005

Cartas novamente...

"Eu considero cartas uma benção. Adoro ler, adoro conhecer a caligrafia das pessoas, gosto de receber cartas em que não houve revisão nem Liquid Paper, com erros sendo reparados à base de riscos ou asteriscos mesmo.

(...)

Mas eu, uma verdadeira anacrônica em muitas coisas, adoro escrever à mão. Não é sempre, claro, mas certas palavras fluem muito melhor do lápis ou caneta para o papel. Declarações apaixonadas por e-mail? Raramente. Por 'scrap' no orkut, então, jamais! Posso até declarar alguma coisa sim, mas nunca terá o romantismo que uma Bic e um bloco de anotações promovem.

Estou ansiosa para saber o teor das cartas trocadas entre Scott Fitzgerald e Zelda. E também para fazer minha imaginação voltar à época em que e-mail, scraps ou 'torpedos' em celular deveriam ser considerados coisa de ficção científica.

'Ai de mim que sou romântica...'"

Patrícia Köhler, em seu excelente
Striptease Cerebral.



Pelo visto, não sou o único saudoso de cartas a se queixar Internet afora... Se mais gente aderir, quem sabe não poderemos fazer um movimento pelo retorno saudável às boas e velhas epístolas à mão?

segunda-feira, julho 25, 2005

Spes



René Magritte, Os Bons Presságios, 1944

domingo, julho 24, 2005

Pílulas pseudofilosóficas

Se o maior inimigo do homem é seu ego, o maior inimigo do ego é o homem que não está à altura dele.

Experimentou na vida um pouco de tudo e, principalmente, muito de nada.

Em terra de cegos, quem finge ter um olho é líder da oposição.

Mentir é para os medíocres. Os sábios promovem campanhas de desinformação.

Rodrigo, autor de blog e filósofo de chuveiro.

Música de fundo: A Primavera, de Vivaldi (apesar do delicioso inverno).

terça-feira, julho 19, 2005

Mundo estranho

Tabloideanas


19/07/2005 - 12h15
Morre nos EUA homem sodomizado por cavalo

O leitor assíduo sabe que o UOL Tablóide não gosta de dar notícias tristes. Mas essa é inevitável. Porque alerta para os riscos de certos exageros quanto a práticas sexuais alternativas.

Nos Estados Unidos, um homem morreu em um sítio freqüentado por zoófilos ao ser sodomizado por um cavalo, segundo a polícia. Trata-se, diga-se, de um caso excepcionalmente raro.

"Do médico legista ao comissário, passando pelos investigadores, ninguém jamais viu algo remotamente parecido com isto", disse à agência de notícias France Presse Eric Sortland, chefe da Polícia de Enumclaw, 60 km a sudeste de Seattle, Estado de Washington.

A vítima, de 40 anos, sofreu graves lesões internas e seu corpo foi deixado por desconhecidos em um hospital de Seattle, no dia 2 de julho, pouco depois do ato sexual. "Seu cólon rompeu, e a hemorragia o matou", revelou Sortland.

O Estado de Washington não proíbe a zoofilia.

sexta-feira, julho 15, 2005

Um retrato tardio

Em 1995, Luciana B. estava em seus 17, 18 anos. Lembro-me dela como de poucas. Não porque se destacasse dentre meus outros colegas de 2º Grau. Pelo contrário, em Luciana, se destaque havia, era justamente o não destacar-se. Se não era exatamente bela, tampouco era feia, situando-se na brumosa média das moças de sua idade. Pele clara, bem cuidada, isenta dos horrores da acne, busto mediano, quadris largos e coxas cheias, denunciando os prováveis duelos com a balança. Os lábios, finos até quase o desaparecimento, encimados pelo nariz reto e bem proporcionado. Ainda assim, não chegava a ser, como disse, bela; antes lembrava uma das pinturas de nobres matronas que enchem nossos museus. Sua juventude não disfarçava certa gravidade, que lhe envelhecia um pouco as maneiras, não se sabe se por educação ou temperamento. A voz não era melodiosa, do tipo que os poetas da idade tanto apreciam louvar. Tinha algo de aveludada, tímida, jamais se elevando além do estritamente necessário. Voz de mulher feita, mais que de adolescente, que se somava à maneira geral de seu porte para sugerir uma maturidade circunspecta. Os cabelos castanho-claros, levemente ondulados, vinham quase sempre presos num coque, de que escapava uma ou fina outra madeixa que lhe dava um toque de improviso.

Como aluna, Luciana era absolutamente comum. Suas notas oscilavam entre seis e oito (a média para aprovação era cinco), com uma ou outra vermelha a dar um pouco de emoção ao seu boletim. Nas aulas, calava-se; se alguma vez ousou dirigir perguntas ao professor, há de ter sido com muita discrição. Comportava-se bem, em geral, e seus pecados estudantis limitavam-se à tagarelice que se espera nas moças de sua idade. Em nosso colégio, as carteiras eram de modelo antigo, acomodando três pessoas na mesma peça. Daí que Luciana contava com a proximidade das mesmas interlocutoras fiéis: Ana Paula à esquerda, Cristiane à direita, e ela própria invariavelmente no meio, a mediar as animadas confabulações diárias. Falavam de tudo, segundo os humores da ocasião: família, dificuldades, planos de futuro, o programa do fim de semana, televisão. Também tudo partilhavam: o material escolar, os esforços nos exercícios, o tempo do recreio, as pequenas intrigas que grassam em toda sala de aula. Era interessante ver como o grau de confidencialidade dos seus assuntos se revelava pela linguagem corporal: o corpo mais projetado para a frente, a voz sussurrante, os rostos próximos, o olhar atento. Pelo menos no que dizia respeito a Luciana, contudo, tais segredos nada tinham de transcendental: não era afeita a grandes especulações filosóficas. Seu mundo era o do dia-a-dia, de sonhos e interesses comuns a todos de sua idade, sem inquietações mais profundas.

Sentava-se bem à minha frente. Nas horas de ócio, mais de uma vez pousei os olhos sobre sua nuca, contemplativo, deixando-me levar pelos fios castanhos que brotavam da pele branca. Era uma visão privilegiada. Até hoje uma vaga memória me traz de volta o aroma de menina asseada que dali se exalava e, vez por outra, se podia sentir de relance. À época, o cronista Artur da Távola elegeu a nuca como a parte mais atraente do corpo de uma mulher. Provavelmente eu teria discordado e visto aí nada mais que pieguice, não fosse já ter descoberto a nuca de Luciana B. De segunda a sexta, das 07h30 às 12h40, ela se punha novamente aos meus olhos, imaculada, nívea e sedosa. Olhar para ela era como encontrar uma estátua grega, cuja perfeição se adivinhava mesmo em seus fragmentos.

Absorta em seu mundo particular, Luciana B. jamais soube que me inspirava essas idéias “neoclássicas”. Nunca foi mais que uma vizinha de fileira, com quem eu mantinha relações cordiais. Uma garota comum, como tantas, sem nada em especial que a destacasse das outras. E, entretanto, dez anos depois da última vez que a vi, ainda posso relembrá-la como se a tivesse visto ontem.

quinta-feira, julho 14, 2005

Devagar e sempre

O Estado de S. Paulo, 13/7/2005:
Tartaruga [sic] fugitiva percorre 30 km antes de ser encontrada
Cicero, EUA - Michelangelo voltou para casa depois de três semanas - devagar e sempre - de pé na estrada. O cágado, Mickey para os íntimos, reencontrou-se com o estudante universitário Kim Heinemann depois que a polícia o encontrou vagando por um subúrbio amais de 30 km do local onde havia desaparecido.
Heinemann havia montado uma campanha de relações públicas para chamar atenção para o drama de seu lento mascote. Em um momento da longa jornada, Mickey foi visto cruzando uma rua movimentada, enquanto os carros paravam para lhe dar passagem.
"Ele parece bem, só está com um pouco de fome", disse Heinemann. Mickey havia desaparecido, em junho, do quintal da casa dos pais de seu dono.

AP


segunda-feira, julho 11, 2005

Gitanjali

Tu me tornaste conhecido de amigos que eu não conhecia, deste-me assento em casas que não eram a minha, trouxeste para perto o que estava longe, e do estrangeiro fizeste para mim um irmão.

Meu coração se inquieta quando tenho de deixar meu esconderijo costumeiro. Eu me esqueço de que o antigo mora dentro do novo, e que aí tu moras também.

No nascimento e na morte, neste ou em outros mundos, aonde quer que me conduzas, tu és sempre o mesmo, o companheiro único de minha vida sem fim. Sim, com laços de alegria tu amarras meu coração àquilo que não conheço.

Quando alguém conhecer a ti, ninguém mais lhe é estranho, e nenhuma porta se lhe fecha. Senhor, atende esta minha súplica: que eu jamais perca a felicidade de ver a presença do único no jogo dos muitos.

Rabindranath Tagore

Gitanjali 2

Não percebi o momento em que atravessei o umbral e entrei nesta vida.

Qual foi o poder que me fez desabrochar neste mistério imenso, como botão de flor que se abre na floresta em plena meia-noite?

Quando, pela manhã, olhei para a luz, senti imediatamente que eu não era um estranho neste mundo. Senti que o Insondável, sem nome e sem forma, me havia tomado em seus braços na forma de minha própria mãe.

Agora também, na hora de minha morte, o mesmo Desconhecido aparecerá diante de mim como alguém que sempre conheci. E porque amo esta vida, sei que também vou amar a morte.

O bebê chora quando a mãe o retira do seio direito. Mas logo depois ele se consola no seio esquerdo.


Rabindranath Tagore

domingo, julho 10, 2005

Flores de Outono

Rosas, rosas de amores,
Senhoras dos versos meus,
No fundo tudo são flores
A caminhar para Deus.

Jésus Gonçalves, hanseniano, pioneiro da humanização e
abertura a visitas dos leprosários brasileiros, 1902-1947.

Pílula filosófica em uma madrugada fria

"O que torna tão aguda a dor provocada pelo ciúme, é que a vaidade não pode ajudar a suportá-lo."

Stendhal


Ao que eu adicionaria que nenhuma subserviência irrita tanto, se vista de fora, quanto à que se curva aos caprichos desse tipo de tirania.


Música para acompanhar: A Cavalgada das Valquírias, de Richard Wagner.

quarta-feira, julho 06, 2005

Divagações sobre a memória

Leio em artigo de Joanna Bernat na coletânea The Oral History Reader que à implantação desta técnica — que consiste no uso de entrevistas como fontes históricas — na Grã-Bretanha, em fins dos anos 60, seguiu-se uma verdadeira febre memorialística. Organizações civis começaram a estimular a produção e a até mesmo publicar autobiografias de pessoas comuns: taxistas, alfaiates, sapateiros, dentre outras categorias que até então estavam mais habituadas a viver a História do que falar sobre ela. O objetivo era dos mais nobres (especialmente considerando a época): dar ao passado as cores e o pathos que nem sempre as fontes documentais tradicionalmente utilizadas pelos historiadores possuem. Ouvir o testemunho direto é sempre emocionante, e descobrir que as pessoas mais anônimas poderiam oferecer uma contribuição importante sobre a história recente — idéia que hoje parece tão óbvia — despertou o entusiasmo de muitos, não só acadêmicos, mas também leitores. Era uma valiosa oportunidade para trazer à tona não apenas os grandes eventos de que o século XX fora tão pródigo — guerras mundiais, crises político-econômicas, revoluções —, mas também a minúcia do dia-a-dia, da rotina, das impressões e interpretações daqueles que ainda não haviam sido incluídos nos livros de História a não ser como massa anônima. O resultado foi bastante rico, mesmo se descontarmos alguns exageros de pesquisadores empolgados com seu brinquedo novo. Publicaram-se coletâneas de depoimentos, volumes e mais volumes de testemunhos sobre os mais diversos assuntos, criando-se um interessantíssimo complemento para os estudos históricos mais tradicionais. Ao reconhecer a importância da memória, além dos documentos escritos de sempre, a História se re-humanizava.

A mim, com meus pendores de antiquário sentimental, esse relato inspirou algumas reflexões. Nada acadêmico, é verdade, do contrário estaria escrevendo um paper e não um post de blog. Mas pensei sobre o que deixamos para a posteridade — e não me refiro às gerações que virão, mas ao nosso próprio Eu futuro, que nos aguarda dentro de alguns anos e décadas. Que deixamos para ele? O que preservamos do nosso presente, ou do passado próximo, além de lembranças sujeitas a mil e um percalços?

Fotografias foram a primeira coisa que me vieram à mente. Mas a maioria delas não dura tanto — que o digam as cores amareladas dos retratos de infância, tirados há apenas vinte e poucos anos (os em preto-e-branco resistem muito mais). Sem dúvida, as fotos têm seu valor, enquanto duram; há sempre algo de tocante em achar uma foto esquecida que nos rememora uma época aparentemente enterrada. Ver os próprios traços, e os de outrem, mais frescos, ainda virgens de todas as experiências que nos separaram daquele momento. Há qualquer coisa de impressionante aí, por mais que o costume tenha amortecido o impacto dessa tecnologia.

Manuscritos... Já falei sobre as cartas em post recente. Mas há outros tipos que podem ser interessantes como âncoras de memória. Particularmente sempre achei os diários um recurso primoroso. Não só pelo que revelam de forma direta — isso interessa muito mais aos outros que ao autor. Mas pela maneira como, enquanto são escritos, nos induzem a ponderar, coordenar pensamentos, emoções e lembranças, dando-lhes alguma coerência, mesmo quando ela não exista originalmente. Pela sua própria forma, o relato nos força à construção de uma racionalidade, e necessariamente ao auto-exame. O diário, mais do que um registro cotidiano, acabe se tornando um instrumento de autoconhecimento, até mesmo, quem sabe, quando visto do Eu futuro. Afinal, revisitar os velhos pensamentos, distantes do calor dos episódios narrados, permite que acompanhemos nossa própria trajetória apesar dos lapsos mnemônicos. Reler as confissões de outros tempos não pode, então, levar-nos a entender melhor o nosso Eu de hoje? Sem falar na possibilidade, formidável por si só, de evocar todo um acervo afetivo inconsciente e inevitavelmente desbotado pela vida.

Não é acaso que o tempo seja representado como um ceifador. Perdas são inevitáveis, recordações são perecíveis. Todos os dias perdemos um pouco da nossa própria vida, na a que virá, como usualmente se pensa, em contagem regressiva, mas a que passou e já nos constituiu. São risos que se apagam, mágoas que (felizmente) cicatrizam, amores que se foram, talvez enterrados sob uma indiferença amorfa. Tudo se vai, e deve ir, mas não é preciso que seja de forma tão devastadora quanto nossa negligência rotineira nos leva a pensar. Algo pode ser preservado, ainda que para nosso próprio usufruto em algum porvir incerto. Alguma coisa, enfim, que poderemos gostar de reaver do (então) passado, da mesma forma como hoje poderíamos desejar algo de épocas que desejamos para trás. Não falo de objetos específicos, entesourados avarentamente; apenas o mínimo de nós mesmos, algo que possa guardar um pouco de nossa essência. Algo, enfim, que possa nos inspirar um sorriso carinhoso quando ressurgir das águas de nosso Letes interior.

***

Preservando sua memória

1 – Escreva um diário. Não precisa anotar todo dia, é quase impossível. Mas registre o que julgar importante, as impressões mais fortes, as experiências mais significativas — aquelas que dão vontade de contar a alguém como desabafo. Geralmente elas são as que levam às reflexões mais sinceras e profundas.

2 – Tire fotos. Não, não aquelas de álbum de família, posadas. Estas têm seu lugar, mas não são tudo, e podem nem ser as mais interessantes. Registre um pouco do cotidiano: um ambiente, uma paisagem, uma cena absolutamente comum... Dê “flagras” na sua própria vida: encontros com amigos, momentos de estudo, expediente de trabalho, trajetos de todo dia. O que mostraria a vida que você leva hoje? Quem são as pessoas ao seu redor? Os lugares que vê? Os caminhos por que passa? As ocupações a que se dedica?

3 – Observe o mundo ao redor. O que dá testemunho dele? Que acontecimentos do presente poderão ser dignos de menção nos livros de História de daqui a 50 anos? Monte arquivos, faça recortes, preserve um pouco do que há de importante fora do seu ambiente imediato. (A Guerra do Golfo e a queda dos regimes comunistas europeus, por exemplo, estão razoavelmente documentados em recortes de jornal no meu armário.)

4 – Que músicas ouve? Como as pessoas se vestem? Já consegue identificar o “estilo” da época atual? (Não é incrível como cada década tem modas próprias, que parecem muito óbvias quando vistas em retrospecto, mas nunca enquanto a vivemos?)

5 – Não esqueça o diário.

6 – Mande cartas. Peça respostas. Espalhe (boas) lembranças suas pelas vidas daqueles que convivem com você.

7 – Se possível, produza seus próprios vídeos. Não é preciso aguardar uma ocasião especial,como festas de aniversário ou cerimônias de formatura. Registre um pouco do dia-a-dia, do seu mundo.

8 – Visite seus cadernos de telefones e endereços. Que amigos nunca mais receberam um telefonema, ou qualquer notícia sua? Mande nem que seja um cartão. Quem sabe a velha camaradagem não ressurge das cinzas? Pode ser mais fácil do que parece à primeira vista.

9 – Releia de vez em quando os livros que mais lhe marcaram. “Reexperimente” o texto, veja que impressões lhe causam agora e, se for diferente, tente descobrir por quê. Terá você “superado” a obra? Ou só agora alcançou o que o autor pretendia passar? O mesmo vale para filmes e programas.

10 – Já disse para escrever um diário?

sábado, julho 02, 2005

Solaris

"I work in the city now. After work I wander and lose myself. I am silent and attentive. I follow the current. I make a conscious effort to smile, nod, stand, and perform the millions of gestures that constitute life on Earth.

I will study these gestures until they become reflexes again. I will find new interests and occupations, but...I will not... give myself. I will not give myself to anything or anyone, because I am haunted by the idea that I remembered her wrong. That I shaded my memory of her to suit myself. That I was unfair to her and caused her destruction. What if I was wrong about everything?

I've come to believe that memory is a curse."




Solaris, de Steven Soderbergh, é usualmente apresentado como um filme de ficção científica. Afinal, tem naves espaciais, um planeta desconhecido, jargões de física e uma história passada num futuro indeterminado. Porém, por trás dessa fachada, o filme é muito mais do que exibição tecnológica e explora bem as possibilidades da ficção científica pré-Guerra nas Estrelas. Em outras palavras, evocando o espaço sideral e a tecnologia como regiões de Mistério, que evocam alguns dos grandes enigmas da vida.

A sinopse é simples: Chris Kelvin, psiquiatra, é chamado para auxiliar no resgate de uma estação espacial de pesquisa que orbita o planeta Solaris e que tem mandado mensagens estranhas à base. Lá chegando, descobre que os poucos sobreviventes estão muito perturbados com algo que se recusam a dizer o que é até que ele, o psiquiatra, tenha experimentado. E, ao dormir pela primeira vez na estação, ele descobre porque seus colegas de bordo relutam tanto em voltar à Terra.

Com diálogos primorosos, uma trilha sonora reflexiva, suave, e uma qualidade de fotografia impecável, Solaris, refilmagem de uma produção russa de 1972 baseado no livro de Stanislaw Lem, é uma obra-prima. É uma reflexão sobre a perda de entes queridos e o que se poderia fazer por uma segunda chance. Um filme intimista, cheio de sutilezas narrativas e visuais, que levanta questões profundas sobre a vida e o que fazemos dela, se há um mesmo sentido transcendente nos bastidores do universo ou se tudo é fruto de nossa vontade de crer nisso.

O filme tem uma espécie de epígrafe, por assim dizer. É um poema de Dylan Thomas, que diz muito sobre o fundo emocional dos protagonistas. Vale a pena relê-lo depois de assistir a Solaris.




And Death Shall Have No Dominion
Dylan Thomas

And death shall have no dominion.
Dead men naked they shall be one
With the man in the wind and the west moon;
When their bones are picked clean and the clean bones gone,
They shall have stars at elbow and foot;
Though they go mad they shall be sane,
Though they sink through the sea they shall rise again;
Though lovers be lost love shall not;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
Under the windings of the sea
They lying long shall not die windily;
Twisting on racks when sinews give way,
Strapped to a wheel, yet they shall not break;
Faith in their hands shall snap in two,
And the unicorn evils run them through;
Split all ends up they shan't crack;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
No more may gulls cry at their ears
Or waves break loud on the seashores;
Where blew a flower may a flower no more
Lift its head to the blows of the rain;
Though they be mad and dead as nails,
Heads of the characters hammer through daisies;
Break in the sun till the sun breaks down,
And death shall have no dominion.